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Artigo de Opinião: Público/Project Syndicate: Egípto: ” A revolução acéfala” por Omar Ashour, director do programa de Estudos do Médio Oriente da Universidade de Exeter, UK.

Novembro 28, 2011

A revolução acéfala do Egipto

“O homem que me ensinou a sacrificar o coração pelo Egipto está morto”, disse Vivian Magdi, lamentando o seu noivo. Michael Mossad foi morto na zona de Maspiro a 9 de Outubro, quando um veículo blindado o atingiu durante um protesto organizado para condenar um ataque a uma Igreja egípcia na região meridional de Assuão. O protesto provocou 24 mortos e mais de 200 feridos – um preço mais alto que o exigido pela chamada “Batalha dos Camelos”, quando as forças de segurança e os rufias armados do antigo Presidente Hosni Mubarak atacaram manifestantes pró-democracia na Praça Tahrir no auge da revolução.

Agora, a Praça Tahrir é mais uma vez cenário de confrontos. “É o 25 de Janeiro outra vez!”, gritou um amigo, enquanto se barricava na praça. Outros ajudavam-no a montar tendas. Mais de 20 mil egípcios encheram a Praça Tahir a 19 de Novembro, tendo pelo menos 3 mil aí pernoitado. Confrontos intermitentes com as Forças Centrais de Segurança eclodiram durante o dia, tal como tinha acontecido a 25 de Janeiro. “Eles voltaram e nós não saímos daqui… abaixo o poder militar… abaixo o marechal [Tantawi]”, disse-me outro manifestante.

A última onda de protestos reflecte a crescente frustração com a gestão da transição política do país feita pelo Conselho Supremo das Forças Armadas (CSFA), actualmente no poder. Mas os confrontos de Tahrir destacam outro problema. Ao contrário das revoltas egípcias de 1882, 1919 e 1952, a revolução de 2011 não tem um líder. Isso representou uma fonte de força durante a queda da ditadura de Mubarak; agora é uma fonte de fraqueza.

A unidade na oposição é habitualmente um factor crítico em transições democráticas bem-sucedidas, como na Polónia, Chile e África do Sul, por exemplo. No Egipto, a unidade política foi mantida – e insuficientemente – durante a luta contra Mubarak, mas começou a fragmentar-se assim que o CSFA assumiu o comando. Polarização ideológica, lutas pela liderança, egos inflacionados e inexperiência na gestão de coligações e negociações causaram sérias divisões nas fileiras dos políticos da oposição. Um activista proeminente descreve o padrão: “Se um líder emerge, as outras figuras da oposição preferem desacreditá-lo, em vez de o apoiar na subida.”

A falta de liderança caracteriza até os Islamistas, possivelmente a força política egípcia mais bem organizada (num conjunto de mais de 70 partidos e coligações). Ultimamente, uma tentativa do Partido da Justiça e Liberdade (PJL) da Irmandade Muçulmana para dominar a Coligação Democrática pelo Egipto (CDE) saiu pela culatra. A CDE, formada para contestar a próxima eleição parlamentar, encolheu de 34 partidos até ao PJL e um punhado de pequenos grupos. Muitos dos outros partidos Islamistas saíram.

Esses partidos apresentam queixas semelhantes. “Os membros da Irmandade Muçulmana dominam muitas das listas de representação proporcional, e assim têm uma maior probabilidade de entrar no parlamento”, diz Tamer Abd al-Khaliq, um activista proeminente em Asala. Safwat Abd al-Ghani, líder do Grupo Islâmico e co-fundador do seu partido, tem palavras mais duras para o PJL: “Isto é oportunismo… Estão a usar os nossos apoiantes no Alto Egipto, onde não têm apoios… e depois deixam-nos para o fim. Querem monopolizar os assentos [parlamentares].”

No meio de uma revolução sem líder, com eleições que se aproximam, o CSFA encontra-se tolhido por múltiplos paradoxos. Padrões observados na América Latina, no Sudeste Asiático e noutros locais sugerem que uma organização militar que detenha o poder num período de transição tentará ampliar a sua influência política. Mas esse esforço poderá variar entre o modelo argelino (perto do controlo total) e a aproximação argentina (influência limitada).

No Egipto, o entendimento inicial era que a organização militar pediria imunidade legal e constitucional para os seus líderes, a continuação dos seus investimentos não orçamentados e livres de impostos, e direito de veto na “alta política”, incluindo assuntos críticos de segurança nacional e de política externa. Quase todos os políticos egípcios credíveis se aprontaram a conceder a primeira exigência e a negociar a segunda e a terceira.

“Se querem garantias legais, devemos dar-lhas”, diz Essam Sultan, o líder adjunto do Partido al-Wasat, a entidade política Egípcia mais próxima do Partido da Justiça e Desenvolvimento da Turquia (AKP). Os candidatos presidenciais e outros chefes partidários proferiram opiniões similares.

Mas o CSFA parece agora compreender que, numa situação sem líder, nenhum político civil poderá conceder imunidade sem se tornar vulnerável ao ataque pelos rivais. Para além disso, o CSFA pesou cuidadosamente os políticos e dissecou as suas fraquezas relativas, a sua capacidade limitada, o seu oportunismo evidente, e a sua inconsistência geral. Como resultado, há a convicção crescente no seio do CSFA de que as suas três exigências “mínimas” se tornaram ao mesmo tempo desnecessárias e insuficientes. Nos últimos dois meses, o comportamento do CSFA para com os políticos civis, os actores da sociedade civil e, mais recentemente, a comunidade Copta, tem reflectido claramente a mudança de atitude: “Vocês necessitam da nossa imunidade, orientação e protecção – não somos nós quem precisa do vosso apoio.”A polarização política, os incidentes sectários, a economia fraca e a ausência de segurança ensombraram as perspectivas do Egipto para uma transição democrática bem-sucedida. Mas, sondando a geração mais jovem, o pessimismo começa a desaparecer, pelo menos um pouco. Observadores da política egípcia espantam-se com a quantidade e qualidade de iniciativas juvenis, que vão desde grupos de pressão para uma transição democrática bem-sucedida até o fornecimento de um sistema para recolha de lixo e o suporte à indústria panificadora.

A persistência destas iniciativas nos últimos sete meses, e o seu sucesso relativo em lidar com múltiplas crises, poderá afastar as suas mentes de expectativas pessimistas. Na verdade, pedi recentemente a um grupo de jovens activistas as suas opiniões sobre possíveis cenários negativos para o período de transição. Responderam-me com uma lista longa. Então um deles sorriu e disse: “Oh, não se preocupe. Vamos deprimir a depressão.”

 

Um comentário

  1. http://www.aljazeera.com/news/middleeast/2011/11/201111285426716706.html



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